Educação

Novo ensino médio já começa a partir de 2025; entenda mudanças

O Novo Ensino Médio terá a sua primeira fase implementada em 2025. A Lei nº 14.945/2024, que institui a Política Nacional do Ensino Médio, será instituída, inicialmente, para os estudantes da primeira série.

A lei sancionada em 31 de julho de 2024, altera a Lei nº 9.394/1996, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e revoga parcialmente a Lei nº 13.415/2017, que dispõe sobre a reforma do Ensino Médio. 

O Ministério da Educação (MEC) afirma que a reformulação busca torná-lo mais atrativo e relevante para os jovens, com o objetivo de combater a preocupante evasão escolar. 

Dados do Censo Escolar 2023, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em fevereiro, revelam que a taxa de evasão desta série alcançou 5,9% em 2021, período marcado pelos impactos da pandemia de Covid-19. 

O percentual faz com que o ensino médio registre a maior taxa de evasão da educação básica. À época da divulgação do censo, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou que, por ano, 450 mil jovens no país abandonam ou saem da escola nessa fase da educação.

O Brasil possui,  atualmente, quase 7,7 milhões de estudantes, destes: 6,7 milhões em escolas públicas e 986 mil em instituições privadas. 

Em 2026, as regras começarão a valer para a segunda série e, em 2027, para a terceira.

Entenda a nova regra

Com a nova lei, a carga horária terá um total de no mínimo,  3.000 horas, sendo 2.400 horas para a Formação Geral Básica (FGB) e 600 horas para os itinerários formativos. A FGB inclui português, inglês, artes, educação física, matemática, ciências da natureza (biologia, física, química) e ciências humanas (filosofia, geografia, história, sociologia). 

O conteúdo da FGB é definido na Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A implementação da nova lei alterou a carga horária mínima de Formação Geral Básica ao longo dos três anos do ensino médio, que antes era de 1.800 horas.  

Já para os itinerários formativos (conjunto de disciplinas, projetos, oficinas, núcleos de estudo, entre outras situações de trabalho, que os estudantes poderão escolher no ensino médio), a carga horária mínima será de 600 horas, com exceção da formação técnica e profissional, quando pode chegar a 1.200 horas. 

Os itinerários formativos permitem o aprofundamento em um área específica do conhecimento como Matemática e suas Tecnologias; Linguagens e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias ou Ciências Humanas e Sociais Aplicadas —, além da formação técnica e profissional (FTP). 

A legislação estabelece que os sistemas de ensino assegurem que todas as escolas ofereçam, no mínimo, dois itinerários formativos, com exceção das instituições que oferecem Educação Profissional e Tecnológica (EPT).

O texto determina que o Conselho Nacional de Educação (CNE), em parceria com os sistemas estaduais e distrital de ensino, deve desenvolver diretrizes para o aprofundamento dos itinerários, levando em consideração as particularidades da educação indígena e quilombola.

“Novo currículo não traz melhroria profunda”

Na visão de Ângela Eça de Oliveira, 50 anos, graduada em Letras pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e  professora regente do Colégio Modelo Luís Eduardo Magalhães, em Jequié, o novo currículo do ensino médio pode ser considerado um avanço, no entanto, ainda não consegue promover uma melhoria profunda na educação.

“É um avanço, uma conquista, contudo, o currículo em si não consegue promover uma melhoria efetiva. O que pode acontecer é que as escolas podem fomentar entre seu corpo docente, a realização de uma educação que funcione para além da mera transmissão do conhecimento, funcionando como uma educação que suscite a produção do conhecimento,  de questionamentos sobre os saberes validados e os não validados, e principalmente,  uma análise sobre a ausência de uma educação antirracista, antissexista, mesmo com o advento das Leis Nº 10.639/03  e 11.645/08 (leis que tornam obrigatórias o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas) que alteram a Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional”, diz a professora.

Oliveira possui especialização em Gestão Estratégica em Políticas Públicas, e, já foi a diretora da Escola Diretora Duque de Caxias, também em Jequié, que durante a sua gestão, no ano de 2011, recebeu o Selo pela Igualdade Racial, concedido à instituições que promovem à preservação da cultura negra por meio de oficinas de arte.

 Na visão da professora, que atua na educação pública há 24 anos, a nova regra para o Ensino Médio não consegue instituir uma “educação libertadora” e  que o modelo de escola atual possui “um lento processo de consciência de classe”.

“Um decreto ou estatuto não consegue adentrar no chão de uma escola. Vamos lembrar que temos uma escola forjada na cisheteronormatividade cristã e ainda num processo lento de consciência de classe. E, para dificultar o processo, a escola foi, ainda é, o espaço que invalida todos os fazeres e privilegia apenas alguns saberes, ou seja, o conhecimento fora da grade curricular instituída é invalidado. O processo de uma educação libertadora, histórico-crítica, transgressora, questionadora, com escrevivência e oralitura [termo usado para designar a transmissão de histórias e conhecimentos ancestrais através de manifestações culturais performáticas e da literatura] é quase impensável para muitas comunidades escolares. Na escola em que ensino, estudamos os métodos educacionais de Paulo Freire, Dermeval Saviani, Bell Hooks, Conceição Evaristo, Leda Martins e Marise de Santana. É bonito no papel, mas na prática é algo utópico, porque a educação brasileira, de fato,  só faz reproduzir privilégios, infelizmente”, complementa.

Na opinião de Ângela Eça de Oliveira, mudanças nos indicadores de avaliação do aluno, serviram para testar a efetividade do novo currículo do ensino médio. Para a especialista, avaliações que repetem o mesmo padrão de medir o nível de aprendizagem do aluno, não auxiliam na mudança dos paradigmas educacionais.

“Não adianta mudar componente curricular, ampliar o tempo de escola, instituir normativas e continuar a avaliação externa, como Prova Brasil e SAEB [avaliações que aferem a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro a partir de testes padronizados e questionários socioeconômicos] que compõem o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), com os mesmos padrões não auxiliam em nada a mudança dos paradigmas educacionais, ao contrário, continuam dando ênfase a práticas excludentes, preconceituosas que validam apenas o saber mensurado em provas que exigem memórias de informação sem análise crítica dos fatos. Outrossim, indicaria  como critério de avaliação, participação nas olimpíadas educacionais, participação em conselhos municipais, parceria com universidades renomadas, publicação de artigos em periódicos, submeter trabalhos em eventos de pesquisa. A avaliação dos alunos têm que ser medida como espaço de produção e questionamentos e não apenas memorização do saber”, completa.

“Currículo pode sobrecarregar estudantes”

Para professora Nicolai Carmo de Brito, 49 anos, graduada em Educação Artística  pela Universidade do Estado do Pará (UEPA) e educadora do Colégio da Polícia Militar da Bahia, o novo Ensino Médio, além de aumentar a carga horária, pode sobrecarregar metalmente os alunos, que, na sua opinião, já  lidam com muitas disciplinas.

“Embora a escola em que trabalho seja cívico-militar, funcionando em um ritmo diferente das demais escolas públicas, isso não impede que a gente siga o cronograma da rede estadual, porque afinal, nós somos professores da rede do estado.  Eu vejo este novo ensino médio mais uma carga pesada para os alunos, que já sentem o peso de muitas disciplinas, é algo terrível para eles.  Eu vejo que, mesmo numa escola militar, muitas das disciplinas não contemplam, de fato, a realidade destes alunos. Os professores tentam se adequar a isso, às vezes sem um preparo, sem um curso, sem um treinamento específico”, disse ela, que possui carga horária de ensino de  40 horas semanais no colégio.

Para a professora, a Secretaria Estadual de Educação (SEC), poderia explicar, para o corpo docente, por meio de cursos ou palestras, como funcionaria o novo currículo e os itinerários formativos. 

“O CPM ofereceu algumas orientações, mas nada específico em relação às disciplinas que já temos. Eu senti falta de um melhor direcionamento por parte da  SEC, de explicar melhor, como funcionaria a nova regra  e, principalmente, quanto aos itinerários, em oferecer um material, uma orientação. Nós é que vamos tentar entender e descobrir de que maneira melhor trabalhar para os meninos”, complementou a profissional, que acrescenta que o novo currículo do ensino médio pode acentuar as desigualdades em relação às escolas particulares do Brasil.

“O novo ensino médio foge da realidade dos estudantes da rede estadual.  Deveria ser reforçado algo que contemple o pensamento crítico, a leitura e a interpretação. Fora que  acentua as desigualdades entre escolas públicas e particulares, especialmente quando aplicado em redes estaduais, onde há dificuldades em ofertar uma educação de qualidade. Há uma falta de alinhamento entre a proposta e a realidade do ensino público que aprofunda ainda mais o abismo educacional existente”.

A reportagem do Notícias da Bahia entrou em contato com secretária de Educação do Estado, Rowenna Brito, para saber como a Bahia tem se estruturado para a implementação da nova regra que passa a valer no ano que vem. 

Em relação à capacitação dos professores e gestores escolares da rede pública para atender a Lei nº 14.945/2024, SEC disse através de uma nota que o “Instituto Anísio Teixeira (IAT), Casa da formação dos professores na nossa rede, realizará formação para a reestruturação da política de ensino médio, tendo em vista as reformulações do Projeto Político Pedagógico, às novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio e a própria configuração adotada pela rede. Da mesma forma, o IAT estruturou formação também para os componentes curriculares que não existiam no currículo anterior”.

Para atender a implementação das mudanças previstas a partir de 2025, a SEC informou que lançou uma consulta pública para apreciação da proposta feita à sociedade civil, “especialmente aos professores, estudantes e coordenadoras pedagógicas da rede estadual”. 

Logo após a consulta, a pasta disse que apresentou a proposta a representações sindical e estudantil. “Os próximos passos serão entregar ao Conselho Estadual de Educação da Bahia (CEE) a proposta para aprovação”.

O órgão afirma que as infraestrutura das escolas do estado estão adaptadas para cumprir a exigência da nova regra do MEC.

“A infraestrutura das escolas públicas da Bahia tem passado por reestruturação anterior à publicação da Lei 14.945, que reformula o ensino médio. Já temos quase 600 escolas reformadas, ampliadas ou construídas tendo em vista atender às necessidades da juventude baiana”, informou o órgão.

A reportagem também entrou em contato com a Secretaria Municipal de Educação (Smed), para saber se houve alguma preparação ou curso especial para os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental que vão ingressar na primeira série 2025.

Por nota, a Smed respondeu que “a Secretaria Municipal da Educação informa que a competência educacional do município se encerra no 9º ano do ensino fundamental. O ensino médio é de competência exclusiva do Governo Estadual, portanto essa demanda cabe ao mesmo”. (Matéria:Notícias da Bahia)

Redação