O FETICHE PUNITIVISTA DA IMPRENSA BAIANA OU A SÍNDROME DA RAINHA DE COPAS
O papel da imprensa atualmente tem sido trocado pelo do judiciário? Mas ela não é para narrar os fatos e apresentar todas as versões da história? E qual a meritocracia há em agir de forma punitivista? Seria a sede pela audiência desenfreada?
Atualmente, os veículos de comunicação assumiram uma característica que, no mínimo, foge às suas atribuições. Vários programas de TV, rádio,sites e revistas, passaram a cobrar punição contra atos que veiculam em suas programações.
O mais recente caso envolve duas crianças que, supostamente, foram vítimas de racismo em uma estação de metrô em Salvador-Ba. O autor do suposto delito, teria sido um dos seguranças que monitoram as dependências da estação. veja: https://emais.estadao.com.br/noticias/comportamento,mae-denuncia-racismo-sofrido-por-filhas-em-estacao-de-metro-da-bahia,70003177414
Antes de entrar no mérito da questão, saliento que qualquer pessoa que pratique racismo deve ser punida, após o devido processo legal, o ato é repulsivo e digno de toda crítica e repreensão. Enfatizo isso, para que não haja nenhuma interpretação que fuja do ponto aqui manifestado.
Chamou atenção a pressa dos veículos de comunicação é exigir a pronta punição do suposto autor do delito. Claro que, como já destaquei, a punição deve ocorrer caso se verifique a veracidade do fato. Entretanto, ninguém trouxe “à baila” a responsabilidade da CCR no evento infausto. Por se tratar de uma empresa que, embora atue no setor de transporte, tem como cliente final uma vasta gama de pessoas – das mais diversas origens e classes sociais – deveria ser ponto de curiosidade perguntar, qual o tipo de treinamento que os funcionários recebem para tratar diariamente com a população.
Apesar de parecer obvio, é fato que muitos processos de seleção apenas se preocupam em perscrutar o candidato afim de saber se reúne as características e saberes necessários à prática da função. Esquecem que, no caso de seguranças, atendentes e recepcionistas, esses funcionários serão os primeiros elementos da empresa a fazer contato com o cliente.
Vou além, as empresas esquecem que seus programas de comunicação institucional e planos de mídia e imagem, passam primeiramente pelos funcionários de maior contato com o cliente. Pensar que o segurança não é elemento ativo no processo de comunicação da empresa é tolice, denota o total desprezo pelo bem-estar do mesmo que pouco capacitado, incorre em ações que o prejudicarão e, por reflexo, prejudicarão a empresa. Mas, situações como essas passam totalmente desapercebidas ao crivo da imprensa. Por que será?
Essa seletividade dos veículos de comunicações locais e aumentada pelos seus “medalhões”, que alimentam sanha punitivista. Demissão sumária por justa causa! Será que demitir vai resolver o problema do racismo velado existente em nosso estado? Claro que não. Principalmente se, volto a repetir, continuar a inexistir o processo de preparo e treinamento de capacitação por parte das empresas. No caso específico, a CCR. Demitir o funcionário de nada adianta se outros e outros poderão incorrer no mesmo erro.
Logo, a mesma imprensa que busca cortar cabeças – e omite notícias sobre casos que envolve os seus pares, exemplo do apresentador que flagrado em alcoolemia que recusou-se a realizar o teste do bafômetro – é a Rainha de Copas que grita histérica: “ Cortem a cabeça”. Como não poderia deixar de ser, movida pela busca insaciável da audiência e fama.
A punição deve ocorrer e, junto com ela, uma investigação das práticas de treinamento da CCR. É preciso saber se uma empresa que recepciona diariamente milhares de pessoas, na cidade tida com o a mais negra do Brasil, possui um treinamento adequado e auxilio profissional para que seus funcionários saibam como tratar o cliente. Se isso não for feito – e provavelmente não será – teremos mais uma vez a imprensa funcionando como veículo do sensacionalismo barato, que apenas serve para demonstrar o seu lado mais deprimente e nefando.
A mesma imprensa que agora se manifesta punitivista e seletiva, esquecendo do seu verdadeiro papel de jogar luz a todas as facetas dos fatos, é a imprensa que se comporta como juíza prolongadora de sentenças, como ficou claro no caso do goleiro Bruno. Assassino da ex-companheira, que cumpre sua pena estipulada pela Justiça, que na compreensão de apresentadores de TV, não tem condição de reintegrar o elemento à sociedade. Perde o sistema de Justiça dom de julgar, oferecer punição e, finda a pena, proporcionar a reintegração do indivíduo ao sistema social, tendo em vista que, para alguns apresentadores de TV, o condenado, mesmo após cumprir a pena, não pode voltar à profissão original para não ser “louvado” pelos fãs. Ora, cabe ao público do futebol tal avaliação e não a o redator ou apresentador de plantão.
Tais fatos são graves, uma vez que atribuem a apresentadores de TV e Rádio uma função e competência que não lhes pertence. O problema se agrava mais ainda, quando se avalia a seletividade dos veículos de comunicação, que só contribui para demonstrar quão falha e vaidosa são as personagens que povoam as redações e os sets de TV e Rádio, interessadas apenas nos índices de audiência e desconectadas da realidade que as cercam.
