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Professora da UFMT deixa conferência de saúde após ser interrompida por prefeito por usar linguagem neutra: “Atitude fascista”

A professora Maria Inês Barbosa, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), deixou a 15ª Conferência Municipal de Saúde de Cuiabá na última quarta-feira (30) após ser interrompida pelo prefeito de Cuiabá, Abilio Brunini (PL), que a repreendeu por utilizar linguagem neutra em sua fala inicial.

Segundo relato da professora em entrevista ao portal UOL, o prefeito teve uma postura autoritária e ameaçou retirá-la do evento por não concordar com o uso de pronomes neutros. “Ele não me ouviu, não quis dialogar. Disse que, se eu continuasse usando pronomes neutros, teria de sair. Eu não ia acatar isso. Então, eu me retirei”, relatou Maria Inês, que classificou a atitude de Abílio como “fascista”.

A conferência é um espaço previsto no Sistema Único de Saúde (SUS) para o debate democrático entre representantes do poder público e da sociedade civil sobre políticas de saúde. Ao ser interrompida, Maria Inês iniciava sua fala tratando da diversidade brasileira, quando usou pronomes neutros, como forma de incluir pessoas não-binárias e reforçar a pluralidade social do país.

prefeito de Cuiabá, Abilio Brunini(PL)

O prefeito interveio dizendo que “na prefeitura não se usa gênero neutro” e ameaçou expulsá-la. Diante da situação, a professora optou por sair por vontade própria: “Eu me retirei porque não iria me calar ou me submeter àquela imposição autoritária. A conferência é um espaço deliberativo, com participação social e controle popular. Ele não tinha o direito de transformar aquilo em ato de poder pessoal”, afirmou.

Qual é a forma correta de pronunciar “todos”?

Durante o debate sobre linguagem neutra, é comum surgirem dúvidas sobre a pronúncia do pronome “todos”, especialmente com a popularização do uso da variação neutra “todes”.

De acordo com a língua portuguesa padrão, a forma correta de pronunciar “todos” é /tô-dus/, com o primeiro “o” fechado e o “s” final soando como /s/ em algumas regiões ou /z/ em outras, dependendo do sotaque (por exemplo, em São Paulo, costuma-se ouvir /tô-dus/, enquanto no Rio de Janeiro, /tô-duz/).

A variação “todes”, usada como forma de inclusão de pessoas que não se identificam com os gêneros masculino ou feminino, não faz parte da norma culta da língua portuguesa, mas é uma construção social e linguística adotada em certos contextos para promover visibilidade à diversidade de gênero. Seu uso e pronúncia (/tô-des/) seguem uma proposta de linguagem inclusiva e ainda geram debates, tanto no meio acadêmico quanto na sociedade em geral.

Debate segue polarizado

O episódio em Cuiabá é mais um reflexo do debate crescente em torno da linguagem neutra no Brasil, que divide opiniões entre defensores da inclusão de identidades de gênero e os que a veem como uma distorção da norma linguística.

A professora Maria Inês afirma que não irá recuar diante de episódios como esse: “Eu sabia com quem estava lidando, mas não iria abrir mão de ocupar aquele espaço: não é dele, é nosso”.

O caso levanta questionamentos sobre os limites da liberdade de expressão, o papel do Estado na regulação da linguagem e o respeito à diversidade em espaços públicos e institucionais.